Escrevo este artigo em Brasília, onde o Conselho Permanente dos Bispos acaba de encerrar a ultima reunião do seu mandato. E antes de continuar a minha viagem a Curitiba, Ponta Grossa e Umuarama, envio esta mensagem ao povo de Humaitá. Entre os muitos assuntos que passaram pela minha cabeça, prefiro ficar com o tema da solenidade deste dia 25 de março: Anunciação à Maria. Há várias maneiras de abordar este tema tão precioso para nós católicos. Aqui desejo destacar um profundo apelo embutido no mistério da Encarnação que envolve Deus e Maria totalmente. Deus escolheu e chamou Maria para ser a mãe do seu Filho em vista do seu povo. “Maria, encontraste graça junto a Deus. Conceberás e darás à luz um filho... Ele será chamado Filho do Altíssimo... Ele reinará para sempre sobre a descendência de Jacó...” (Cf. Lc 2, 30 ss) Ora, Deus sabia que Maria tinha outros planos. O plano de Deus não estava no horizonte desta jovem mulher judia. No entanto, Maria colocava Deus e sua vontade em primeiro plano. Ela intuía que era a hora de despachar planos pessoais para aderir o ainda desconhecido plano de Deus.
Para nós cristãos acontece algo semelhante: A partir do nosso batismo, Deus nos chama seus filhos adotivos, que não devem ter mais medo dele, mas tratá-lo como Pai querido. Tendo recebido o Espírito Santo, vale também para nós aquela bela saudação: “Alegra-te, cheia de graça! O Senhor está contigo!” Também nós somos destinatários de uma missão específica que tem relevância social (até política), ou seja, uma missão referente ao Reino - tão solicitado por nós.
Já faz um bom tempo que declaramos como direito humano fundamental a auto-realização. Com outras palavras: Cada um tem o direito de viver e desenvolver suas capacidades como puder e quiser. Meditando a Sagrada Escritura, nós cristãos podemos concordar com esta declaração só parcialmente. Pois: Fomos criados para amar e servir. Palavras chaves de nosso programa de vida: Doação e oblação. Maria adequou sua vontade à vontade de Deus, abandonou seus planos pessoais de auto-realização para acolher o projeto de Deus. E nestas alturas, Maria fez o maior e melhor que pôde fazer em prol da humanidade.
É algo difícil para entender? Nem tanto. Um (bom) homem público não pertence a si mesmo, mas ao povo. Um padre há de colocar sua vida a serviço dos fiéis. Um pai ou uma mãe devem colocar a família em primeiro plano... Há tendências em nossa sociedade que reforçam o egoísmo a tal ponto que as pessoas não conseguem mais tolerar diferenças nem deficiências, mas partem para a separação e a condenação do outro. Bem, se Deus nos coloca a serviço do outro, como podemos fugir do outro? Pergunto: Será que nossos adolescentes e jovens aprendem desde cedo de nós adultos, que nossa vocação é servir aos outros? (E não apenas aos simpáticos.) Trabalhar para o bem do outro acaba de nos realizar num nível bem mais profundo e autêntico do que atender os próprios desejos. E ai vem a relevância social de uma educação que visa muito mais o serviço aos outros e à própria sociedade do que ao desenvolvimento das potencialidades individuais.
Ontem (24/ 03) celebramos na capela da CNBB o 31º aniversário de assassinato de D. Oscar Romero, de El Salvador. No dia 01º de maio assistiremos à beatificação do Papa João Paulo II. Dois homens que não procuraram realizar seus desejos pessoais, mas servir aos outros, mesmo à custa da própria vida (D. O. Romero). Não fizeram outra coisa senão seguir o Mestre que não veio para ser servido, mas para servir. Assim Jesus se tornou instrumento da salvação para a humanidade. O tríduo pascal celebra este despojamento de Jesus, sua doação aos homens, sua oblação ao Pai ao qual o Pai respondeu ressuscitando o seu Filho. - Catequizar bem é educar para servir, ”pois é dando que se recebe e é morrendo que se vive para a vida eterna”.
Que a comunhão e a Paz sejam abundantes e a alegria da ressurreição de Cristo esteja em nossos corações hoje e sempre.
Feliz Páscoa
Dom Francisco Merkel
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